Cadernos de Literatura Comparada, #53
(dezembro 2025)
Cuidar do tempo: arte e (des)aceleração
Org. Ida Alves (UFF/ ILC) e Luis Quintais (UC)
Data-limite: 15 de setembro 2025
A arte contemporânea, por diferentes meios e processos, interroga muito atenta e criticamente a superexposição que veio a caracterizar inegavelmente o século XX – e estas primeiras décadas do XXI – a partir da presença quotidiana e bastante disseminada da fotografia, do cinema, da televisão e mais recentemente do ecrã do computador, do telemóvel e outros aparelhos eletrónicos correlatos. O desenvolvimento tecnológico, que produz meios cada vez mais velozes de deslocamento e mesmo novos instrumentos ou práticas de comunicação e divulgação de informações, alterou irremediavelmente as formas de contato entre os sujeitos, sobretudo urbanos, e a sua compreensão de espaços e tempos. Imersos cada vez mais na visualidade excessiva, submetidos a uma aceleração da vida, como questionam Paul Virilio (1993, 1994, 2010), George Didi-Huberman (2000) e Hartmut Rosa (2012), a Arte pode favorecer experiências de resistência como uma espécie de contra-veneno , capazes de favorecer a desaceleração técnica, social e existencial. Ao reaproximar o fruidor de uma criação estética, chamando sua atenção para o jogo de detalhes e de outras percepções, o gesto artístico pode interromper o fluxo contínuo da alienação (a indiferença ao mundo) ou, pelo menos, problematizá-la.
Em relação ao contexto temporal em que estamos todos imersos, numa entrevista a Bjørn Schiermer , o já referido sociólogo Hartmut Rosa expõe exatamente um ponto de vista que interessa discutir neste número dos Cadernos de Literatura Comparada, ao estabelecer a ligação entre experiências do tempo e existência:
O problema é que […] o processo de aceleração e crescimento incessante, começou a mostrar o seu lado ruim. Assim, no nível coletivo, parece que destruímos o mundo que queremos disponibilizar: […] No nível individual, existe o perigo de o mundo ficar mudo, surdo e silencioso para nós sujeitos. Quando olhamos para a história cultural, sempre foi o grande medo da modernidade que o mundo em que vivemos morra de alguma forma para nós; que comece a parecer desencantado, frio, indiferente, talvez hostil, como Albert Camus percebe; que estejamos profundamente alienados dele.
Se na nossa atualidade também se tornam cada vez mais problemáticas as relações entre os sujeitos e as formas de habitação do espaço, dados os interesses económicos, as condições políticas e a massificação virtual, estabelece-se a necessidade de fortalecer e expandir a reflexão sobre a ideia-base capaz de transformar essas relações. Tal ideia pode ser sintetizada na expressão “cuidar do mundo”, que tem ecoado em diversos espaços de discussão e de criação, intimamente ligada a um pensamento ecocrítico e a uma abordagem reflexiva recuperada aos povos originários, como defendem, por exemplo, os pensadores e ativistas ambientais brasileiros Ailton Krenak (2019, 2020) e Davi Kopenawa Yanomami (2010, 2023). Por isso, este número dos Cadernos de Literatura Comparada destaca a ideia de cuidado, tendo em mente percepções da temporalidade na modernidade tardia e modos de existir no mundo atual. Portanto, ao desenvolver o tema “Cuidar do tempo: arte e (des)aceleração”, os organizadores convidam articulistas de diversas áreas disciplinares e de criação, com perspectiva comparatista, a discutir tópicos referentes, como:
• Arte e figurações / refigurações do tempo;
• O enfrentamento da aceleração na vida quotidiana e os modos como a literatura e outras artes explicitam essa problemática e assumem modos de resistência;
• O cuidar do tempo a partir da relação transformada do homem com a natureza e a arte;
• A exigência da lentidão no processo da criação e da recepção do objeto artístico;
• Formas inovadoras e práticas originais de estabelecer, no campo estético e em diferentes linguagens, modos de desacelerar a vida enquanto habitação de um espaço / tempo;
• A atual sociedade do cansaço e o discurso distópico ou arruinado tão evidenciado, por exemplo, em alguma prosa e poesia contemporânea;
• Modos de estranhamento e desencontro decorrentes da vivência espacial radicalmente transformada pela velocidade quotidiana e pelo descarte de tudo;
• Temporalidade, ecocrítica e (des)aceleração.
Todos os artigos devem ser enviados, por e-mail, para cadernosreviewdecember@gmail.com até 15 de setembro de 2025.
Os artigos submetidos devem estar de acordo com as normas de publicação dos Cadernos de Literatura Comparada, disponíveis em:
https://ilc-cadernos.com/index.php/cadernos/about/submissions
Os artigos não adaptados a estas normas de edição serão rejeitados.
Serão aceites trabalhos inéditos em português, inglês e francês.
Este número 53 dos Cadernos de Literatura Comparada é organizado por:
Ida Alves (Universidade Federal Fluminense) e Luís Quintais (Universidade de Coimbra)