Entre Emily Dickinson e Luiza Neto Jorge não há apenas um século de distância: há duas línguas, duas tradições literárias, dois contextos histórico-sociais e duas obras que divergem entre si. Ao mesmo tempo, porém, são surpreendentes as continuidades que se estabelecem entre as duas autoras quando sobre elas se faz incidir um olhar de teor aproximativo. Ambas criam um idioma desviante, que tanto suscita entusiasmo quanto incompreensão. Ambas obrigam à reformulação dos pressupostos crítico-literários tradicionais e à criação de um diferente tipo de público. Ambas – poetas vulcânicas – ameaçam o status quo literário e social com a sua torrente poética, ainda que obliquamente, no caso de Dickinson, e ciclopicamente, no caso de Neto Jorge. Revelando formas singulares de insubordinação, as obras poéticas de Emily Dickinson e de Luiza Neto Jorge contribuem decisivamente para a reconceptualização da categoria de sujeito presente na tradição da Modernidade, através da desestabilização operada pela emergência de uma subjectividade instável (mas) feminina.